Então passei a me chamar Ari. Se tirasse uma letra, meu nome seria Ar. Achava que devia ser ótimo ser o ar. Eu poderia ser alguma coisa e nada ao mesmo tempo. Ser necessário e invisível. Todos precisariam de mim e ninguém conseguiria me ver.
“Certa noite de verão, caí no sono desejando que o mundo fosse diferente quando eu acordasse. Quando abri os olhos de manhã, estava tudo igual.” Quem disse isso foi o Aristóteles (não o filósofo, apenas um garoto de quinze anos), nas primeiras linhas do livro Aristóteles e Dante Descobrem os Segredos do Universo (adicione ao Skoob), tema deste post.
Aristóteles é um garoto de quinze anos, de descendência mexicana, vivendo dia após dia com seus dilemas. Introvertido, meio temperamental, dono de um humor sarcástico, o adolescente tem certa dificuldade para se expressar e fazer amigos. Quando as emoções transbordam, elas vem naquela energia da adolescência onde a gente às vezes tem raiva de tudo e não entende porque as coisas são como são. Apenas sente.
Quis fechar os olhos e deixar o silêncio me engolir.
“Sentimento” é algo que flui pelas páginas de Aristóteles e Dante Descobrem os Segredos do Universo, livro do americano nascido em Novo México, Benjamin Alire Sáenz.
Certo dia, enquanto está na piscina, Aristóteles conhece Dante, um garoto da idade dele que se dispõe a ensiná-lo a nadar, e nasce aí uma amizade que promete durar a vida inteira. O engraçado é que os dois não são muito parecidos. Aristóteles é melancólico, nervoso, guarda o mundo para si e passa boa parte do tempo amargurado com os problemas de sua família e os seus próprios; Dante, em contrapartida, é expansivo, confiante, sensível e se dá perfeitamente bem com seus pais.
Fiquei pensando que alguns poemas são como pessoas. Algumas pessoas você entende de primeira. Outras você simplesmente não entende… e nunca entenderá.
A amizade dos dois é algo que completa as partes que faltam do quebra-cabeça complicado que é a adolescência. E ela é super importante para o desenvolvimento da história, mas curiosamente não é o principal. Este podia ser mais um livro sobre como é importante ter amigos para ajudar você nas horas difíceis, especialmente nessa fase, mas passa longe disso. Ele não cai no óbvio.
Descobrir-se, e descobrir quem você quer ser no mundo, é parte da dura jornada que é crescer. Esse é um livro interessado em falar de descobertas e relacionamentos interpessoais. E não só de Aristóteles, mas de todos os personagens. Todos eles tem uma batalha para travar.
Na história, as famílias dos dois personagens tem um papel fundamental, e funcionam de forma diferente. A lição que fica é que o amor é incondicional. E ver os nós se desamarrando aos poucos é interessante e envolvente.
– Você vai passar a vida se pondo para baixo?
Eu já fui Dante. Hoje sou mais Aristóteles, pelo menos quando se trata de falar de mim. É que, no fundo, não basta você falar, você tem que saber falar. E nem sempre a gente se expressa bem. O turbilhão de emoções que a gente vive, seja com 15, com 20 ou 30 anos, faz parte da vida, mas ninguém falou como era difícil não desapontar ninguém, especialmente a si mesmo, como era difícil escolher o caminho certo, e decidir por qual bandeira lutar.
As quase 400 páginas, que cobrem cerca de dois anos da vida dos garotos, passam voando. Tem um determinado ponto do livro em que você não sabe bem para onde o Ari vai te levar, mas daí algo acontece e te lembra a razão de estar ali. Não é assim que a vida funciona, às vezes?
Porém, ele nunca fez nenhuma pergunta sobre mim. Diferente de minha mãe, ele respeitava meu mundo particular.
(…)
– Não sei lutar essa guerra, pai.
– Você devia ter pedido ajuda – ele disse.
– Também não sei fazer isso.
Eu gostei bastante de Aristóteles e Dante Descobrem os Segredos do Universo. Tem coisas na escrita que me incomodaram um pouco e a postura defensiva de Aristóteles pode não agradar a todos, mas na última parte do livro (ele é dividido em 6), fui tomada pelas emoções que o autor propôs. E gostei. Foi diferente. Benjamin soube retratar bem as dificuldades dos personagens, talvez por ter passado por coisas semelhantes (ou até piores).
Benjamin Alire Sáenz é graduado em filosofia, teologia e tantas outras coisas, e já foi reconhecido com um American Book Award (1992) e o PEN/Faulkner Award (2013). Aristóteles e Dante foram responsáveis pela escolha da obra como Livro de Honra do Printz Award em 2013. Espero que você tenha a oportunidade de ler algo dele. Eu adorei a experiência (e a Anna do Pausa para um Café também, olha aqui a resenha dela).
Minha mãe e meu pai deram as mãos. Imaginei como era – como era segurar a mão de alguém. Aposto que às vezes é possível desvendar todos os mistérios do Universo na mão de uma pessoa.
Aristóteles e Dante Descobrem os Segredos do Universo foi cedido pela Editora Seguinte ao Pipoca Musical por conta da parceria. Acompanhe as novidades da editora nos canais: Site | Facebook | Twitter | Instagram
Ficha Técnica
Título: Aristóteles e Dante Descobrem os Segredos do Universo
Autor: Benjamin Alire Sáenz
Ano: 2014 (original: 2012)
Gênero: Young Adult
Editora: Seguinte
Páginas: 394
Skoob: adicione à estante
Compre: Companhia das Letras (lançamento 30 de abril)