A loucura intrínseca de O Rei de Amarelo

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Certo, então eu li O Rei de Amarelo (adicione ao Skoob) motivada pelas menções em True Detective, e também pelo grupo do Vórtice Fantástico de Blumenau, que o elegeu como livro do mês. O título, lançado pela Intrínseca no Brasil, reúne 10 contos de Robert W. Chambers, dos quais 4 mencionam o tal Rei de Amarelo. O livro é dividido em duas partes, com quatro contos cada, separadas por duas histórias “de transição”.

A primeira parte (com os contos O Reparador de Reputações, A Máscara, O Pátio do Dragão e O Emblema Amarelo) traz os contos fantásticos que mencionam o Rei de Amarelo, uma peça de teatro que leva seus leitores à loucura completa (psicologicamente falando), e se passa em um mundo distópico imaginado pelo autor.

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Os contos intermediários (A Deimoselle d’Ys e O Paraíso do Profeta) são ligeiramente fantásticos, porém com um pé no realismo, e são menos trágicos que os contos predecessores. A terceira e última parte é formada pelo Quarteto de Ruas (A Rua dos Quatro Ventos, A Rua da Primeira Bomba, A Rua de Nossa Senhora dos Campos e Rue de Barrée), uma seleção de contos mais românticos, ainda que tenham leves referências aos eventos da primeira parte (nomes de personagens e locais, por exemplo). São histórias que, embora tenham momentos trágicos, exaltam o amor. Duas partes bem nhé, que acabei relevando por conta da qualidade dos primeiros contos.

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O Rei de Amarelo: a peça teatral

Na verdade, O Rei de Amarelo é uma peça teatral que leva seus leitores à loucura e ações estranhas. O livro, encadernado em pele de cobra, era separado em dois atos, um mais avassalador que o outro.

Durante a leitura dos contos de Chambers, somos assolados por uma curiosidade insaciável de saber o que diabos está escrito nesse livro, mas só vemos seus efeitos colaterais nos personagens. Particularmente acho isso ótimo, já que dificilmente nos impressionaríamos com o conteúdo da peça teatral, invalidando toda a proposta dos contos.

As quatro histórias são trágicas e envolventes, deliciosas de se ler. Desde a sua publicação, muitos autores tentaram escrever o que seria esse texto tão maldito. De acordo com as notas da revisão de Carlos Orsi na edição da Intrínseca, a versão mais bem sucedida é More Light, de James Blish.

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O ambiente dos contos também é bem interessante. Na história que abre o livro, somos apresentados a uma Nova York opressora, onde judeus e negros são expulsos do Estados Unidos e Câmaras de Suicídio foram construídas para atender uma demanda de pessoas desesperadas (detalhe: isso escrito bem antes sequer da Primeira Guerra). Mais à frente, a possibilidade de que isso tudo era um delírio e que o universo de O Rei de Amarelo seria um sonho compartilhado por todos os seres humanos nos é apresentada. Além de tuuuudo isso, tem ainda o fato de que os contos de conectam de alguma forma, seja com nomes de personagens ou locais.

[LEIA+: Entrevista com Carlos Orsi, que contribuiu com a edição brasileira de O Rei de Amarelo]

A deformação mental vinha da leitura – em especial – do segundo ato. Outra interpretação plausível para os efeitos da peça, avaliando o que acontece com os personagens, é que a leitura de O Rei de Amarelo funcione como um “ritual” para transformar sua visão de vida. Após a leitura, os personagens tem suas vidas transformadas.

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O Amarelo e as inspirações

Na última década do século XIX, o Amarelo era uma cor muito associada ao pecado, podridão, decadência e loucura. Na Itália, é associada também ao sensacionalismo, tanto que até hoje a literatura sensacionalista é chamada de Literatura Amarela. As inspirações de Chambers provavelmente estavam bem ligadas às obras de Baudelaire e Oscar Wilde, bem como Ambrose Pierce, de quem Chambers empresta o nome de locais e pessoas como Hastur e Carcosa.

Na década em que foi escrito provavelmente era fácil de engolir que um livro pudesse levar alguém à loucura. Hoje em dia provavelmente a história não ia colar. Ou iria? Temos casos de assassinatos cometidos por conta de inspiração em livros, jogos, notícias e tudo o mais. Seria um desequilíbrio do leitor? Ou uma mudança de perspectiva tão radical que faria alguém perder a razão?

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Para finalizar, a edição da Intrínseca de O Rei de Amarelo é simplesmente sensacional. Tanto a tradução esforçada e eficiente Edmundo Barreiros quanto a revisão apurada de Carlos Orsi, que recheou o livro com diversas de notas de rodapé. Sem elas, o livro não seria o mesmo, pois Carlos Orsi nos chama a atenção aos detalhes e entrelinhas dos contos, seja pela ligação através de nomes ou locais, seja pela ambientação da época em que Chambers os escreveu.

Alguém aí já leu? E se você soubesse que a leitura de determinado livro te levaria à loucura, leria mesmo assim?

Ficha Técnica

Título: O Rei de Amarelo
Autor: Robert W. Chambers
Ano: 1895
Gênero: Contos
Skoob: adicione à estante
Compre: Submarino | Americanas

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Comentários

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10 comentários via blog

  1. Isabella comentou em

    Eu esperava mais desse livro. Também comprei ele nessa vibe de True Detective, porém pensei que os contos iam ter um pouco mais de, hm, terror. Acho que por isso me decepcionei um pouquinho e acabei parando de ler depois do terceiro conto. Não que seja um livro ruim; pelo contrário. Só recomendo aos leitores que se interessarem por ele que não esperem ler contos de terror extraordinários, porque não é disso que eles tratam.

    1. Oi Isabella,

      Particularmente, gostei bastante dos quatro primeiros contos. O primeiro me deixou arrepiada, os outros não tinham tanta carga de horror, mas ainda assim achei os quatro excelentes. O Emblema Amarelo é o meu favorito. Concordo sobre a expectativa, é bom controlar esse monstrinho, hahaha.

      Bj

  2. Yago Cavalcanti comentou em

    Esse livro deve ser incrível! Fiquei curioso por causa de True Detective e depois que li um trecho na internet fiquei ansioso para lê-lo inteiro; pretendo comprá-lo em breve.
    Sua resenha é ótima.
    Abraço.

    1. Olha, não vai muito com a expectativa da série, mas depois que você ler os contos, vai entender porque eles aparecem em True Detective. Mas tipo, não é BASEADO, sabe? Ainda assim vale a pena ler, gostei muito dos quatro primeiros contos que envolvem o tal livro.

      Abração, obrigada pelo elogio e pelo comentário. <3

  3. Mariana comentou em

    Eu tinha curiosidade de comprar esse livro mas acho que não comprei ainda por ser de contos. Engraçado, não tenho muita experiência em ler contos e tenho uma resistência em conhecê-los. Acho que tenho a sensação de que pelo fato de ter várias histórias, eu vou me esquecer delas. ashidiuhasida

    1. Hehehe, se não for seu estilo de leitura, nem adianta mesmo. :) Eu adoro livro de contos, especialmente quando é tudo do mesmo autor <333

  4. Li há pouco tempo e simplesmente adorei a primeira parte do livro, em que a mitologia do Rei de Amarelo aparece de forma mais contundente. Sem dúvidas uma obra que recomendo demais a leitura, para quem gosta de horror especialmente.

    1. Eu curti muito, muito, muito os contos do Rei de Amarelo. Os outros nem tanto, mas os que tinham o livro foram fantásticos. Também recomendo. :D

  5. Agora fiquei tenso, será que arrisco minha sanidade mental pra ler o livro? E vai que acontece algo? :|

    Existe um caso parecido também com o Apanhador no Campo de Centeio. Que era o livro que o assassino do John Lennon lia, quando atirou no cantor. E se não me engano existe uma teoria da conspiração em torno da obra.

    Mas é difícil saber de onde que vem a influência, se da realidade, que passa a transpassar para a obra, ou vice versa. É um papo bem maluco…

    Mas tenho curiosidade de ler o Rei de Amarelo sim, também por causa do True Detective…

    1. É, lembrei de O Apanhador no Campo de Centeio quando mencionei essa questão da loucura “no nosso mundo”. Acho válida a discussão, sabe. Teve até um caso do King, que ele pediu pra remover a obra de circulação porque algumas pessoas estavam cometendo crimes em nome do livro. Algo bizarro. O ser humano é meio bizarro né.

      Quanto ao True Detective, a obra é levemente mencionada e tem alguns aspectos dela na série, mas não espere uma adaptação, viu?

      Bjs!