Lugar Nenhum e a jornada extraordinária de um homem comum

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Era sexta-feira à tarde. Richard havia percebido que os acontecimentos são seres covardes. Eles nunca acontecem sozinhos: vêm numa matilha, pulando juntos sobre alguém ao mesmo tempo.

Ao longo desse mês dedicado ao grande Neil Gaiman, já comentamos várias vezes sobre a incrível versatilidade desse escritor. Gaiman não tem problema algum em criar para formatos diversos, e uma das grandes provas disso é Lugar Nenhum, nascido do roteiro da série de televisão homônima escrita por ele mesmo. Ainda na metade da década de 90, Neil era conhecido apenas pelo seu trabalho nos quadrinhos, tinha publicado somente a ficção Belas Maldições, em parceria com Terry Pratchett. Com um roteiro tão bom para a série de TV em mãos, ele fez os devidos ajustes e lançou seu segundo livro; uma obra que, mesmo antes do divisor de águas que foi Deuses Americanos, tem os traços mais marcantes da literatura do escritor.

Nosso herói aqui é Richard Mayhew, um jovem executivo que leva uma vida normal e meio chata. Rotina tediosa, compromissos exaustivos, namorada que exige mais do que ele consegue oferecer, etc. Uma noite, quando está a caminho de um jantar de negócios, ele encontra na rua uma garota ferida; Richard para e a ajuda, e a partir daí tudo muda.

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Richard escreveu mentalmente em um diário imaginário: Querido Diário – começou ele. Na sexta-feira eu tinha um emprego, uma noiva, uma casa e uma vida normal (bom, pelo menos até o ponto em que a vida consegue ser normal). (…) Agora não tenho mais noiva, casa ou emprego, fico andando a esmo a uns sessenta metros abaixo das ruas de Londres e minha expectativa de vida é tão longa quanto a de uma drosófila suicida.

Richard leva a garota para casa e cuida dela. A moça se chama Door, e conta a ele que está sendo perseguida por dois assassinos que mataram seus pais. Já percebendo que algo de muito estranho estava acontecendo, Richard vai atrás do Marques de Carabas a pedido de Door. Os dois se encontram e somem sem ele perceber. É segunda-feira e o nosso entediante herói deve voltar à rotina, no entanto, tudo está diferente. Ninguém em Londres consegue perceber Richard; os táxis não param para ele, no trabalho ninguém o reconhece e na volta para casa ele vê outras pessoas morando em seu apartamento. Ele resolve ir atrás do Marques e de Door para descobrir o que está acontecendo, e é assim que a jornada por uma outra parte de Londres começa: a Londres de Baixo.

A Londres de Baixo é uma cidade que Richard descobre que existe abaixo da Londres que ele conhece. É uma cidade entre os túneis de esgoto e estações de metrô, com mercados flutuantes e todos os tipos de habitantes, de ratos falantes à guerreiros e caçadores. E depois de interagir com as pessoas de lá, ele descobre que passa a pertencer àquele lugar. O lugar onde todos que estão perdidos vão, e que não há como voltar para a Londres de Cima.

Junto do Marques de Carabas e da guarda-costas Hunter, Richard passa a acompanhar Door em sua jornada pela Londres de Baixo, em busca do homem que contratou os dois assassinos que mataram sua família. A jornada os leva ao encontro de senhores que reinam em estranhos trens subterrâneos e ao poderoso anjo Islington, protetor da Londres de Baixo e que pode ajudá-los em sua missão.

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Richard não acreditava em anjos, nunca acreditou. E não seria agora que começaria a acreditar. Mesmo assim, era mais fácil não acreditar em alguma coisa quando ela não estava olhando diretamente para você e dizendo o seu nome.

A grande habilidade que Gaiman mostra em Lugar Nenhum é a de habitar seus mundos. Aqui, ele cria toda uma nova cidade, com sua civilização, regras e habitantes. Gaiman dá vida à uma sociedade de ratos, outra de monges, cria um bazar onde todos se reunem e faz o mundo de cima parecer muito sem graça. Estes personagens secundários que atravessam as histórias são comuns na literatura dele, mas a precisão com que o autor cria aqui é incrível. Ler Lugar Nenhum é realmente se sentir na Londres subterrânea.

Há uma semelhança bem grande entre o formato dos três primeiros grandes livros de Gaiman: Lugar Nenhum, Stardust e Deuses Americanos. Todos são histórias de pessoas comuns que embarcam em aventuras extraordinárias, e o mais importante em todas essas jornadas não é o objetivo final, mas sim o que acontece durante elas. A parte importante é tudo que acontece entre o início e o fim, as pessoas que os heróis (que não têm nada de heróis) encontram no caminho e o que elas aprendem com isso. É tudo sobre a jornada em si, não o objetivo dela.

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– O que você quer? – retrucou, desconfiada.
– Nada. Não quero nada. Nada mesmo.
E então se deu conta de que aquelas palavras eram a mais pura verdade e de como aquilo era horrível.

Em Lugar Nenhum é assim, no fim o que eles buscavam não era tão importante, mas a busca em si foi o que mudou completamente Richard. A viagem extraordinária mostra que a vida não precisa necessariamente ser a chatice do mundo real que ele havia se acostumado. De alguma maneira, parece-me que é sempre com essa ideia que Gaiman cria suas histórias fantásticas, pra mostrar que dentro da nossa cabeça um mundo mais interessante pode existir, e isso já é o bastante.

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Você tem um bom coração. Às vezes isso já salva a pessoa, seja lá onde ela estiver. Mas nem sempre.

Ficha Técnica

Título: Lugar Nenhum
Autor: Neil Gaiman
Ano: 2010
Editora: Conrad Editora
Gênero: Fantasy
Páginas: 336
Skoob: adicione na estante

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Comentários

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5 comentários via blog

  1. Silvana Crepaldi comentou em

    Esse foi o único livro do autor que eu li e não gostei. Achei tão confuso. Mas como não podemos julgar um autor por apenas um livro, vou ler outro.

    Blog Prefácio

  2. Jandson comentou em

    Neil Gaiman é muito bom !

  3. Assim como outros livros de Gaiman, este concentra-se na mensagem a ser passada no decorrer da história, que por sinal é muito bem construída!
    Estou muito curiosa para conhecer mais sobre a Londres de baixo :)
    Adorei a resenha, espero ler em breve!

  4. Thais Alves comentou em

    Neil sempre nos apresentando conceitos novos

  5. Shadai comentou em

    Realmente, esse livro lembra muito o ótimo Deuses Americanos, que por acaso é a única obra do Gaiman que li até hoje, e adorei, apesar de achar o final um pouco fraco.
    Esse parece bom também, quando eu estiver a fim de ler uma “fantasia realista” vou procurá-lo.